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Les copains d’abord - Os amigos em primeiro lugar (ou Os amigos de bordo): Georges Brassens

Osvaldo Saraiva




Les copains d’abord - Os amigos em primeiro lugar (ou Os amigos de bordo)

Letra e música: Georges Brassens, 1964


Para quem me conhece, sabe da minha admiração por Georges Brassens. De origem simples e tendo conseguido prover-se de uma literatura sem igual, o “mestre anarquista” denunciava as hipocrisias da sociedade, com sarcasmo e classe ao mesmo tempo, isso atravessando a contracultura (revolução de maio de 68).


Essa canção é um hino à amizade, onde ele usa “e abusa” da figura de linguagem do “duplo sentido”, mas sem ambigüidade! : na metáfora do barco. Como traduzi acima, “d’abord” tanto se traduz como “em primeiro lugar” quanto “ à bordo”. Uma apologia deliciosa à amizade, alegre, contagiante. Existem muitas análises das canções de Brassens, e essa certamente não fica atrás. Terei que ser muito conciso aqui, e para facilitar, traduzir o sentido de alguns termos, no contexto, esperando que vocês possam apreender o máximo.




Non, ce n'était pas le radeau

De la Méduse, ce bateau

Qu'on se le dise au fond des ports

Dise au fond des ports

Il naviguait en pèr' peinard

Sur la grand-mare des canards

Et s'app'lait les Copains d'abord

Les Copains d'abord


Não, não era A Jangada

Da Medusa, este barco

Que se diz no fundo dos portos

Ele navegava tranquilamente

No grande lago dos patos

E se chamava Os Amigos em Primeiro Lugar


“A Balsa da Medusa" é a obra do pintor Théodore Géricault, entre 1818 e 1819, marcando o início do romantismo francês. Géricault teria se inspirado no naufrágio em 1816 da Fragata saindo da França, em direção ao Senegal, na África, com intenções de colonização. A pintura representaria o momento em que as personagens lutam à deriva.

Trata-se de visão sintética da vida humana abandonada ao seu destino. Géricault decidiu representar a vã esperança dos marinheiros naufragados: o barco salva-vidas é visível no horizonte, mas navega sem vê-los. Toda a composição é orientada para essa esperança, culminando na figura negra do barco, elementos muito representantes do Romantismo.





Ses fluctuat nec mergitur

C'était pas d'la litterature

N'en déplaise aux jeteurs de sort

Aux jeteurs de sort

Son capitaine et ses mat'lots

N'étaient pas des enfants d'salauds

Mais des amis franco de port

Des copains d'abord


Suas “fluctuat nec mergitur

Não era literatura

Sem ofensa aos conjuradores

Seu capitão e seus marinheiros

Não eram filhos de bastardos

Mas amigos “frete pago”

Os amigos em primeiro lugar


“Fluctuat nec mergitur”,  “Flutua mas não afunda”, em latim, é a Divisa da cidade de Paris que tem por emblema um navio.






C'étaient pas des amis de luxe

Des petits Castor et Pollux

Des gens de Sodome et Gomorrhe

Sodome et Gomorrhe

C'étaient pas des amis choisis

Par Montaigne et La Boetie

Sur le ventre ils se tapaient fort

Les copains d'abord


Não eram amigos de luxo

Os pequenos Castor e Pólux

Gente de Sodoma e Gomorra

Não eram amigos escolhidos

Por Montaigne e La Boétie

Na pança eles batiam forte:

Os amigos em primeiro lugar


Castor e Pólux

Da mitologia grega, os gêmeos partilham a mesma mãe, porém têm pais diferentes — o que significa que Pólux, por ser filho de Zeus, era imortal, enquanto Castor não o era. Com a morte deste, Pólux pediu a seu pai que deixasse seu irmão partilhar da mesma imortalidade, e assim teriam sido transformados na constelação de Gêmeos. Brassens lembra que a amizade des “copains” não é nada de divino ou mitológico, mas bem humana.


Sodoma e Gomorra

Sodoma e Gomorra são duas cidades mencionadas na Bíblia que foram destruídas pelo juízo de Deus. A destruição das cidades de Sodoma e Gomorra está registrada no livro de Gênesis. As duas cidades foram destruídas por causa da terrível depravação de seus habitantes. Os sodomitas e os cidadãos de Gomorra são lembrados na Bíblia pela forma com que transgrediram a Lei de Deus.

No marxismo cultural “inocente” da geração de Brassens, aqui entende-se também uma alusão à homosexualidade: Eram “copains d’abord”, mas eram machos, viu? rsrsrs


Montaigne e La Boétie

O filósofo Michel de Montaigne (1533-1592) teve uma grande amizade com o poeta Etienne de La Boétie. La Boétie foi conselheiro do Parlamento de Bordéus, então na Corte, é o autor do Discurso sobre a Servidão Voluntária escrito quando ele ainda não tinha 20 anos e foi publicado na íntegra após sua morte em 1563 por Montaigne.

A amizade entre os dois homens é uma história de amor que termina abruptamente com a morte de La Boétie aos 33 anos.

Brassens insiste no caráter ordinário da amizade em questão, nada de nobreza.







C'étaient pas des anges non plus

L'Évangile, ils l'avaient pas lu

Mais ils s'aimaient tout's voil's dehors

Tout's voil's dehors

Jean, Pierre, Paul et compagnie

C'était leur seule litanie

Leur Credo, leur Confiteor

Aux copains d'abord


Eles também não eram anjos

O Evangelho, eles não tinham lido

Mas eles se amavam, sem véus

Jean, Pierre, Paul e companhia

Era a única ladainha deles

O Credo, a Confissão deles

Aos amigos em Primeiro


Brassens era anticlerical, tema frequente em suas letras. Aqui, a “religião dos amigos”  era os princípios do amor, da transparência, da confiança e fidelidade.







Au moindre coup de Trafalgar

C'est l'amitié qui prenait l'quart

C'est elle qui leur montrait le nord

Leur montrait le nord

Et quand ils étaient en détresse

Qu'leurs bras lancaient des S.O.S.

On aurait dit les sémaphores

Les copains d'abord


Ao menor incidente

Era a amizade que se sobrepunha

Era ela quem lhes mostrava norte

E quando eles estavam em perigo

Que seus braços lançavam S.O.S.

Parecia semáforos

Os amigos em primeiro lugar


Trafalgar: Batalha ocorrida em 21 de Outubro de 1805 entre os franceses e espanhóis contra os ingleses.






Au rendez-vous des bons copains

Y avait pas souvent de lapins

Quand l'un d'entre eux manquait a bord

C'est qu'il était mort

Oui, mais jamais, au grand jamais

Son trou dans l'eau n'se refermait

Cent ans après, coquin de sort

Il manquait encore


No encontro dos bons amigos

Não havia ausência

Quando um deles faltava a bordo

É porque estava morto

Sim, mas nunca, jamais

Sua lacuna na água se fechava

Cem anos depois, incrivelmente

Ele ainda fazia falta



"Poser un lapin", "pôr um coelho", é uma expressão popular significando "dar um furo com alguém, faltar ao encontro".





Des bateaux j'en ai pris beaucoup

Mais le seul qu'ait tenu le coup

Qui n'ait jamais viré de bord

Mais viré de bord

Naviguait en père peinard

Sur la grand-mare des canards

Et s'app'lait les Copains d'abord

Les Copains d'abord


Eu peguei muitos barcos

Mas o único que resistiu

Que nunca mudou de rumo

Navegando tranquilamente

No grande lago dos patos

E se chamava “Os Amigos em Primeiro Lugar” / “Os Amigos à Bordo”




Tendo recebido o “Grande Prêmio de Poesia da Academia Francesa” em 1967, traduzido em mais 20 línguas, objeto de mais 50 teses, Brassens dissipa seus valores universais e atemporais em suas canções, “que je vous invite vivement à découvrir”!












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